O futuro em jogo


Autor(es): A gência o globo : Alexandre Abrantes
O Globo 
Em 30 anos de desenvolvimento internacional já vi muita coisa, trabalhando em lugares como Serra Leoa e Libéria. No entanto, é difícil pensar em uma tragédia tão grande quanto a que assolou o Haiti há um ano.

O terremoto matou pelo menos 230 mil pessoas e deixou 1,3 milhão de desabrigados, soterrando grande parte da vida da nação e apagando os avanços contra a pobreza da década anterior. Em frios termos econômicos, o sismo causou danos e perdas de US$7,9 bilhões, 120% do Produto Interno Bruto do país.

Esta tragédia é função da enorme pobreza, amplificada pela densidade populacional. O Haiti, país mais pobre do hemisfério, era também o menos preparado para desastres e é o mais mal equipado para a recuperação.


Após o terremoto, o mundo se uniu para ajudar o Haiti. A Minustah, liderada pelo Brasil, e assistentes internacionais salvaram milhares de vidas, trataram feridos, abrigaram 1,3 milhão de pessoas que perderam suas casas e providenciaram água, comida, saúde e educação. O enorme trabalho de remoção dos escombros e reconstrução continua, mas é mais lento do que todos gostariam - dificultado por um furacão e pelo surto de cólera que matou mais de 3 mil pessoas.

Um ano depois, a maioria dos atingidos continua em acampamentos improvisados. A Comissão Provisória de Recuperação do Haiti lidera os esforços para fornecer alternativas de habitação e serviços, mas o ritmo da reconstrução mostra o grau de dificuldade em um país tão pobre.

Trabalhando em locais antes densamente povoados, onde a titulação de terras e códigos básicos de construção eram inexistentes, uma equipe de 280 engenheiros locais, treinados por um programa financiado pelo Banco Mundial e outros doadores internacionais, inspecionou 400 mil edifícios para determinar quais podem ser habitados. O próximo passo é garantir que os desabrigados, a maioria não proprietários, tenham um lugar para viver em melhores condições para suas atividades econômicas. O Banco Mundial está ajudando a desenvolver uma política habitacional que, entre outras coisas, ajudará a reconstruir casas em troca do compromisso de aluguéis estáveis e acessíveis.

O apoio ao governo do Haiti, que não foi poupado pelo terremoto, é uma das principais preocupações. Embora os doadores tenham ajudado o governo a restabelecer suas principais funções (serviços de educação, saúde, transporte, gestão econômica), muito ainda é preciso para construir a capacidade necessária para a reconstrução. O governo também precisa aumentar a transparência e reforçar as instituições em geral para melhorar a sua eficácia.

Também é essencial que o povo do Haiti possa confiar no resultado do processo eleitoral. Isso não só assegurará a estabilidade, mas também encorajará mais apoio privado e internacional.

A resposta da comunidade internacional não tem precedente. Até o fim de dezembro, metade dos 5,3 bilhões de dólares prometidos pelos doadores para os próximos dois anos já havia sido entregue. O Brasil foi o primeiro a contribuir para o fundo de reconstrução do Haiti. O Banco Mundial já reservou 479 milhões de dólares, dois terços dos quais já aprovados para projetos específicos como limpeza de canais e entulho, reconstrução de moradias e infraestrutura e apoio à educação e gestão econômica, bem como desenvolvimento do setor privado.

A reconstrução da infraestrutura pode demorar mais de uma década. Muito pode ser feito para ajudar os haitianos no curto prazo. Em 2011, juntamente com outros doadores, o banco se concentrará no combate ao cólera, na expansão do acesso à educação, no reforço da capacidade governamental e em oferecer alternativas para os acampamentos em locais mais bem equipados, onde as pessoas possam reconstruir não apenas casas, mas suas vidas.

Eu continuo a ter esperança. O mundo testemunhou a resiliência e a engenhosidade do povo haitiano. Acredito que, com sua perseverança e o apoio firme da comunidade internacional, inclusive do Brasil, o Haiti vai construir um futuro melhor.

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